Defensores públicos debatem a participação das defensorias nas manifestações populares

anadep

A onda de manifestações populares que se alastrou pelo Brasil recentemente foi uma das maiores da nossa história. No turbilhão dos protestos, o país viveu diversos episódios de violência policial, abuso de poder e violação de direitos. Para debater a atuação e o papel das defensorias públicas nesse cenário, a Associação Nacional dos Defensores Públicos, a Anadep, e o Fórum Justiça promoveram o evento “Defensoria Pública: ação estratégica para a garantia de direitos em manifestação populares”, nesta segunda-feira (7), na Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (UnB). O encontro contou com a participação de defensores de várias regiões do país, representantes do Governo Federal, do Judiciário, do Ministério Público Federal e de organizações voltadas à garantia dos direitos humanos.

O que se viu nas ruas, nos cartazes e nos gritos dos manifestantes é sintoma de uma grave crise entre a população e as instituições Executivo e o Legislativo buscaram reagir, não entrando no mérito das decisões adotadas, apresentando medidas para responder minimamente aos anseios das ruas . Porém, essa não foi a postura do Judiciário. A advogada da Terra de Direitos que integra a Articulação Justiça e Direitos Humanos (JusDh), Érika Medeiros, salientou, na assembléia, que as instituições do sistema de justiça parecem não se enxergar como interlocutoras das demandas colocadas pelas multidões que ocuparam as ruas, no que diz respeito à percepção da necessidade de reformas internas. “A justiça brasileira precisa dialogar com o povo, a democratização da justiça é urgente e passa, necessariamente, por transformações estruturais nas instituições que compõem o sistema de justiça e, portanto, pela incorporação de mecanismos de participação social e transparência”, defende.

A assessora jurídica popular da Terra de Direitos, Luana Xavier, mencionou que o afastamento do Judiciário desse debate expõe a noção de “falsa imparcialidade” que paira sobre o sistema de justiça. “A partir do momento em que você não se posiciona para defender os direitos humanos, você já está tomando uma posição. A imparcialidade não existe. Há setores conservadores no sistema de justiça, mas a defensoria pública deve ser aquele que está do lado da população”, pontua.

Como propostas de abertura do sistema de justiça a mudanças, Érika citou a criação de canais de diálogo permanente entre a Defensoria Pública, a sociedade civil e os movimentos sociais e  também mecanismos que permitam a participação popular na gestão da instituição (implementação de mecanismos como orçamento participativo e audiências públicas para debates relacionados a violações de direitos humanos, por exemplo).

Movimentação recente, reivindicações antigas

“O Gigante Acordou” era o que se dizia. No entanto, é possível fazer uma modificação nessa frase: apenas uma parte do gigante acordou, pois a outra nunca esteve adormecida. Há décadas movimentos sociais levam suas pautas e reivindicações às ruas, lutando por melhores condições de vida da população, inclusive por acesso à justiça. Érika analisa que os (ainda poucos) debates promovidos recentemente pelo sistema de justiça acerca das manifestações  nem sempre contemplam os movimentos historicamente presentes nas mobilizações, como se não fosse importante garantir atenção às manifestações que continuam cotidianas nas ruas. “Há algumas pequenas sinalizações de diálogos com as mobilizações populares, porém os movimentos sociais historicamente organizados e suas manifestações parecem continuar sem espaço nas análises e agendas empreendidas pelo sistema de justiça. É como se apenas as reações negativas do Poder Público e suas instituições recaíssem sobre eles: a intensificação dos processos de criminalização, violenta repressão e adoção de medidas legislativas punitivas tem esses movimentos como principais atingidos”, esclarece.

Luana enxerga que, para consolidar os direitos democráticos e fundamentais, a atuação da Defensoria Pública é crucial. “Qualquer tipo de abuso pode ser minimizado com a atuação das defensorias, mas é interessante consultar grupos que já estão organizados contra esse tipo de violência”, indica.

Autonomia dos defensores

A autonomia funcional dos defensores públicos também foi debatida na Assembleia. Existem casos em que eles sofrem represália ou têm sua autonomia funcional tolhida pela própria Chefia da Defensoria. Foi esse o caso recente vivenciado por defensoras públicas do Rio de Janeiro, em sua atuação na Vila Autódromo,. Uma liminar da própria defensoria foi derrubada pela sua Chefia-Geral  e num complexo processo de remoção. Durante a assembléia, foi entregue uma carta do Fórum Nacional de Reforma Urbana em repúdio a esse episódio.

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

5 + 2 =