SITRAENG | É o Conselho Nacional de Justiça ou seria o poder hegemônico?

Na última sexta-feira (5) e sábado (6), a JusDh lançou em Belo Horizonte o livro Justiça e Direitos Humanos: Olhares críticos sobre o Judiciário em 2015, publicação da Terra de Direitos que  compila 12 experiências de assessoria jurídica popular no campo da defesa dos direitos humanos e  já foi lançada em Curitiba e Brasília.

Maria Eugenia Trombini, assessora jurídica da Terra de Direitos e cientista social, esteve presente nos dois dias de eventos e participou da roda de conversa “Que justiça queremos e precisamos?” e do debate “E quem controla o judiciário?”, atividades promovidas com o apoio de organizações locais.

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É o Conselho Nacional de Justiça ou seria o poder hegemônico?

Palestrantes falam sobre o conservadorismo do judiciário e defendem seu urgente controle social, para que a realidade das normas se aproxime da vida real dos cidadãos.

Fonte: Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciário Federal no Estado de Minas Gerais (Sitraemg)

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Foto: Gil Carlos

Ao falar sobre a “independência e transparência do Poder Judiciário da União”, no debate sobre o tema promovido pelo SITRAEMG na manhã desse sábado, 6, no hotel Normandy, em Belo Horizonte, o juiz André Augusto Salvador Bezerra, do Tribunal de Justiça de São Paulo, partiu do princípio de que a Constituição Federal em vigor trouxe duas realidades: a realidade das normas e a realidade da vida.

E isso se reflete no poder judiciário, o que pode ser comprovado com a frase segundo a qual a CF trouxe a “explosão da litigiosidade”, com a permissão da ampliação do acesso da população aos serviços da Justiça. Só que esse acesso não acontece de fato, porque o judiciário atua de forma bem distanciada da grande parte da população.

Falava-se na necessidade do controle externo do Poder como tentativa de solução, mas o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) foi criado, pela Emenda Constitucional nº 45, e isso não aconteceu. O CNJ, formado basicamente por juízes, transformou-se em um órgão correicional, gerencial, preocupado mais com a rápida resolução de processos, e não com a garantia de direitos. Para resolver o excesso de litígios, optou por estabelecer metas, tratando o jurisdicionado como mero “cliente”. E se a Justiça é lenta, joga a culpa nos servidores.

O judiciário, lamentou o magistrado, burocratizou-se. E ele questiona a falácia de que o cidadão brasileiro procura mais o judiciário que em outros países, argumentando que “o Estado deveria efetivar os direitos sociais”. Segundo dados do próprio CNJ, 51% dos processos têm o Estado como parte; 38%, os bancos; 6%, as telefonias. Apenas 5% das lides são da grande maioria da população. A referência desse poder passou a ser a segurança jurídica, para garantir, é claro, os interesses dos maiores litigantes.

O magistrado paulista defende a necessidade de aproximar o judiciário da sociedade, para que, assim, a realidade das normas se alinhe à realidade da vida. “Quanto maior o controle social, mais forte o judiciário ficará. Temos que colocar na mesa de discussão a democratização do judiciário com a participação da sociedade civil”, reforçou.

Quem controla é o poder hegemônico

“E quem controla o Judiciário?” foi o tema abordado pela assessora jurídica da Terra de Direitos, Maria Eugênia Trombini. Tecendo breve histórico, ela relatou que, com o fim do Regime Militar, em 1985, começou a pressão para que se criasse um órgão de controle externo no judiciário, apesar do temor dos magistrados de viessem a lhes tirar a independência, como nos tempos da ditadura.

Mas as discussões prosseguiram, com o mundo jurídico favorável ao controle apenas por membros do próprio judiciário. Tanto que, em 2004, pouco antes da criação do CNJ, o STF e o STJ, em sessões de suas respectivas cortes, rejeitaram o controle externo, e o então presidente do TST declarou que, em poder de Estado, “não poderia haver controle externo”.

O CNJ, rememorou a mestranda em Ciência Política pela UFPR, acabou sendo criado em 2004, através da EC 45, e instalado somente em 2005, mas com forte influência do Estado norte-americano (Estados Unidos), do Fundo Monetário Internacional (FMI), do Banco Mundial e outros órgãos estrangeiros. A presença basicamente de representantes do próprio judiciário e do Ministério Público no Conselho, avaliou a palestrante, reflete bem o controle do poder hegemônico que conduziu a criação do órgão.

Com isso, perpetua-se o conservadorismo na própria formação do quadro da magistratura, com a prevalência de homens, brancos, católicos e casados, diferentemente do perfil de profissões como a medicina e inúmeras outras. “Essa crítica se aplica ao MP, aos demais órgãos do mundo jurídico e à própria OAB”, observou a assessora.

E esse hermetismo do judiciário, continuou a palestrante, permitiu um distanciamento ainda maior dos magistrados em relação aos servidores do próprio poder. No aspecto remuneratório, em que essa diferença se apresenta mais visível, constata-se atualmente que os magistrados do País chegam, ao final da carreira, com subsídios (vencimento básico) 13 a 16 vezes superior à remuneração média da população, enquanto em países desenvolvidos como a Alemanha e a Itália, por exemplo, é de 2 a 6 vezes.

Enquanto isso, o modelo de gestão é similar ao de uma produção industrial. As sentenças e decisões são padronizadas, para atender as metas, quando, muitas vezes, as decisões judiciais requerem a sensibilidade dos magistrados e até a necessidade de irem a campo, como ocorre no trabalho do oficial de justiça, para conhecer a realidade das partes. E o judiciário passa a falsa ideia de neutralidade, mas é parcial e, infelizmente, ressaltou a palestrante, tem atuado, muitas vezes, no sentido de “criminalizar” a política.

Como intervir socialmente nesse sistema? A proposta alternativa, disse Maria Eugênia Trombini, seria o controle social do judiciário, com a sociedade podendo questionar diretamente a atuação dos magistrados e participar das tomadas de medidas de sanção que lhes são aplicadas. O judiciário tem que estar submetido à sociedade como os outros poderes. “Como tentar aumentar a participação social no poder? São 1.100 faculdades de direito no País. Temos que começar pelos bancos das faculdades…”, concluiu.

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