Brasil de Fato | Relação entre Judiciário e empresas marca segundo dia de debates do JusDH

Violações de direito por parte de empresas representam boa parte dos casos judiciais no Brasil, afirma jurista
Fonte: Brasil de Fato
Por Rafael Tatemoto

Edição: José Eduardo Bernardes

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A relação entre empresas e o Judiciário marcou os debates do segundo dia de atividades do 5º Seminário Nacional da Articulação Justiça e Direitos Humanos (JusDH). A entidade articula diversos órgãos e pessoas que integram iniciativas para a promoção dos direitos humanos e a democratização do sistema de Justiça.

Para André Augusto Bezerra, magistrado e integrante da Associação Juízes para a Democracia (AJD), as violações de direito por parte de empresas representam boa parte dos casos judiciais no Brasil. “A primeira coisa que se fala quando se pensa no Judiciário é a morosidade. Os números provam isso”, diz. Citando dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Bezerra afirma que há, hoje, 102 milhões de processos no país.

“Desses, em 52 milhões o Estado está envolvido. O resto envolve particulares”, aponta Bezerra. Segundo ele, entretanto, este restante é composto majoritariamente por ações envolvendo empresas, 56% relacionados a bancos e 12% a empresas de telefonia.

Para ele, “se duas categorias de empresa lotam o Judiciário, é possível entender que o problema pode estar nelas. Uma conclusão possível é que essas empresas usam o Judiciário para violar direitos. É barato para elas ingressar na Justiça”.

Decisões

Esse volume de ações, de acordo com sua visão, acaba gerando decisões judiciais desumanizadas e que reforçam o poder econômico.

“Um dos efeitos é burocratização dos direitos. Isso tem se refletido na jurisprudência. As empresas têm conseguido cada vez mais decisões favoráveis, por exemplo, no Superior Tribunal de Justiça. Para a grande empresa sai barato violar direitos”, diz.

Luciana Pivato, advogada da Terra de Direitos, apontou que as relações entre Judiciário e empresas são ainda mais íntimas: parte dos magistrados brasileiros participam de eventos patrocinados por companhias.

Citando uma reportagem da Folha de S.Paulo, Pivato lembra que integrantes do Tribunal Superior do Trabalho receberam em troca de palestras proferidas para o Bradesco: “quatro ministros receberam, juntos, 200 mil reais em dois anos para realizar palestras para o Bradesco. Depois, se viu que eles tinham processos do banco para julgar”.

Responsabilização

Parte do debate do Seminário se voltou para a discussão relacionada à responsabilização de empresas por violações de direitos humanos. Gonzalo Berron, da Fundação Friedrich Ebert, explica que há dois processos paralelos. O primeiro, incentivado pelos países do norte global, focado na ideia de planos baseados em termos de cooperação entre empresas e Estados nacionais. O segundo, a proposta de criação de um tratado internacional vinculante.

Para Berron, o primeiro modelo é “voluntarioso, deixando muito na mão das empresas”: “As empresas têm que apresentar um plano sobre como evitar violações. Serve quase como propaganda. Em 2014, algumas organizações e alguns Estados, lançaram um esforço conjunto para discutir um tratado. Até agora houve duas sessões para debater o tema”.

Tchenna Maso, do Movimento dos Atingidos por Barragens, reforça a crítica em relação à primeira fórmula, afirmando que, no Brasil, há acúmulos em relação ao debate que devem ser aproveitados e que, em outros países, tal modelo já se demonstrou ineficaz.

“Não é o momento de discutir um plano nacional de ação. Temos que discutir a partir das diretrizes do PNDH 3”, diz. Ela cita o caso da ruptura da barragem da Samarco em Mariana.

“A Samarco tinha um selo de ‘responsabilidade social’. E, em relação à Mariana, ela atua dentro destes marcos. Através da arbitragem, ela blinda o acesso das famílias à Justiça”, exemplifica.

 

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