JusDh e Plataforma pela Reforma do Sistema Político contestam indicação de Mário Maia para vaga no Conselho Nacional de Justiça

Articulações da sociedade civil denunciam a ausência de debate público e falta de critérios como raça e gênero na escolha de nomes.

Foto: Gil Ferreira/ Agência CNJ

A Articulação Justiça e Direitos Humanos (JusDh), rede nacional que, desde 2011, reúne entidades, organizações e movimentos sociais que atuam na defesa de direitos humanos, no enfrentamento das profundas questões de acesso e democratização da justiça, e a Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político, articulação de movimentos, entidades, fóruns e redes que, desde 2004, atua para mudar a forma como o sistema político brasileiro está organizado institucionalmente, vêm manifestar REPÚDIO à indicação da Câmara dos Deputados Federais para a vaga da sociedade civil no Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

A Câmara aprovou, na data de hoje (27/10), o nome de Mário Henrique Nunes Maia, filho do ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Napoleão Nunes Maia. A indicação contou com o apoio de 12 partidos (PT, PDT, Rede, PCdoB, DEM, PSDB, PSD, PP, Solidariedade, MDB, Republicanos e Avante).

O Conselho Nacional de Justiça  foi apresentado como uma das principais inovações da chamada “Reforma do Poder Judiciário” (EC 45/04), com o objetivo de tornar-se um mecanismo de  participação e controle, aperfeiçoamento e democratização da justiça.

Passados quinze anos, é fundamental refletirmos sobre o papel que vem sendo desempenhado pelo Conselho, a fim de também refletir sobre as perspectivas de mudança no Judiciário brasileiro.

O órgão  é composto por  15 membros com mandato de 2 anos, admitida 1 (uma) recondução.  Desses 15, 11 são representantes do sistema de  justiça,  2 advogados indicados pela Ordem dos Advogados do Brasil e 2 cidadãos de notável saber jurídico e reputação ilibada, indicados um pela Câmara dos Deputados e outro pelo Senado Federal.

Em quinze anos de CNJ, tivemos 9 indicados à vaga pelo Legislativo,  em razão da recondução – que se tornou quase obrigatória – dos membros indicados pela Câmara e o Senado, fato que não se verifica nos cargos ocupados por membros do Poder Judiciário. Desses nove membros, ao longo de 15 anos apenas 1 mulher foi indicada na vaga do Legislativo. Nenhum negro foi indicado nessas vagas destinadas a cidadãos.

Essas duas vagas preenchidas por cidadãos foram entendidas como possibilidade de participação e diálogo desse órgão com a sociedade civil que o Legislativo representa. Entendiam-se essas vagas como uma possibilidade de participação de novos olhares para o sistema de justiça e o  rompimento  com o encastelamento em que se encontram os “operadores do Direito”, bem como a elite togada – branca, heteronormativa e classista – que compõe o Poder Judiciário no Brasil.  Essas vagas deveriam viabilizar a voz de tantos setores que cotidianamente atuam com a garantia de direitos humanos perante a justiça. Por esse motivo, um mandato de 2 anos, com rotatividade nos nomes, permitiria a representatividade mais plural e democrática destes cargos .

A realidade é o oposto dos ideias de democratização, participação e controle social presentes na criação do Conselho enquanto ferramenta de planejamento estratégico de enfrentamento aos problemas estruturais do Poder Judiciário brasileiro. Não se tem notícia de nenhum esforço de convocar ou envolver a sociedade na escolha desses dois nomes pelo Legislativo. Nenhum debate público foi instaurado até então. Para além da falta de participação social na escolha e indicação dos nomes, não há mecanismos de audiências públicas para pautar a atuação desses conselheiros após sua escolha. Que sociedade, então, eles têm representado?

Certamente, não é a sociedade brasileira. Em um país de maioria negra, porém regido pelo racismo estrutural, o Legislativo, em suas indicações ao CNJ, escolheu manter uma composição que reflete não a diversidade do país, mas sua desigualdade.  De igual forma, a  (quase) ausência de mulheres nas vagas indicadas pelo Legislativo é sintomática. A população brasileira é composta por 48,2% de homens e 51,8% de mulheres. Elas são maioria também no curso de Direito: a mulheres representam cerca de 55% do total de matrículas nos cursos de Direito e 42,3% do total de advogados no Brasil. 

A missão institucional do Conselho é “contribuir para que a prestação jurisdicional seja realizada com moralidade, eficiência e efetividade em benefício da sociedade”. Não é possível fazer isso sem a  sociedade civil. Como discutir os problemas que dizem respeito à estrutura e cultura institucional, bem como o corporativismo, apenas com membros vinculados ao próprio sistema de justiça?  O Legislativo não tem cumprido sua função de garantir  a participação da sociedade pelas vagas que são destinadas a sua indicação.

Rever a estrutura do sistema de justiça requer que outros olhares e vivências possam ser também representadas no âmbito do CNJ.  A  diversidade racial e de gênero  deve ser defendida  não só como solução para diversificar em termos numéricos, mas para, qualitativamente, ampliar o horizonte interpretativo  do que significa um sistema de justiça moral, eficiente e efetivo para o cidadão brasileiro.

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